Escoteiro com O ou U?
Para quem não conhece a AEP e a História do Escotismo em Portugal pode parecer estranho que se utilizem duas grafias para uma palavra, que, além de homófona é homónima. São vulgares as acusações de erro ortográfico a quem utiliza a expressão "escoteiro" - assim mesmo, com um "o" - em vez do atualmente mais vulgarizado "escuteiro", com "u".
Afinal, qual delas está certa? Estão as duas, como adiante veremos, embora talvez mais a primeira (escoteiro).
Passamos a esclarecer:
Em 1911, surgia em Portugal o primeiro grupo de boy-scouts, organizado segundo os princípios delineados por Lord Baden-Powell, o fundador do movimento escotista. Porque a adoção do estrangeirismo não agradou aos mentores do grupo, foi adotada uma palavra já existente na língua portuguesa, com uma fonética e um significado muito semelhantes ao scout saxónico: escoteiro, (s.m.) pioneiro; aquele que viaja sem bagagem, gastando por escote; adj. leve; veloz. (Dicionário Porto Editora)
Assim, em 1913 foi fundada a primeira associação escotista portuguesa, a A.E.P. - Escoteiros de Portugal, que, até hoje, mantém a grafia original.
Na década de 20, a Igreja Católica idealizou criar outra associação escotista, mas com carácter uniconfessional, destinada exclusivamente aos jovens que professavam a religião Católica Romana. Assim nasceu o "Corpo de Scouts Católicos Portugueses", mais tarde "Corpo Nacional de Scouts".
Por desconhecimento da pronúncia inglesa, a expressão "scout" era pronunciada à maneira francesa: "secúte". E, embora com outro desfecho, a história repetiu-se - os responsáveis daquele movimento católico tentaram encontrar uma palavra portuguesa que soasse ao ouvido de uma maneira próxima de "secúte" e com um significado ajustável. Escolheram o "escuta", justificando que, para além da semelhança fonética, o "scout" era atento e observador e, por isso, se adequava ao significado da palavra. Apesar de ser um conceito muito redutor veio a vingar, dando origem ao "Corpo Nacional de Escutas".
Durante o regime anterior ao 25 de Abril de 1974, a AEP sobreviveu com grandes dificuldades, sendo considerada indesejável e apenas tolerada. Chegou mesmo a ser publicado um Decreto que extinguia a atividade da AEP nas colónias. Entretanto, o CNE, sob os auspícios da Igreja, atingiu uma notável expansão e, felizmente, conseguiu manter acesa a chama escotista durante a longa noite da ditadura. Enquanto o "escotismo" definhava, o "escutismo" foi-se tornando cada vez mais conhecido dos portugueses.
No entanto, até meados do século, é mais frequente encontrar a grafia "escoteiro" em livros e jornais portugueses. Curiosamente, esta é uma das questões onde nunca houve consenso nos diversos acordos ortográficos. Os brasileiros sempre escreveram "escoteiro".
Esta diferenciação, nunca foi objeto de grande polémica, até porque os escoteiros consideram-se irmãos entre si e os valores da fraternidade escotista estão muito acima de meros preciosismos etimológicos. Pelo contrário, os escoteiros até consideram vantajosa a existência das duas grafias, pois assim se torna muito mais fácil identificar a que associação pertence o adepto dos ideais de Baden-Powell.
© Carlos Robalo (antigo Dirigente do Grupo 129 TV)
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